
Contos de Baco
TEATRO DO MONTEMURO
“À frente de Baco ou ATRÁS DE TODOS OS DEUSES”
Religião ou agronomia, economia ou química, filosofia ou medicina, pintura ou biologia, geografia ou gestão empresarial, história ou física, antropologia ou botânica, literatura ou política…, todas as áreas do pensar, criar, saber e saber fazer que preenchem a Vida têm uma palavra a dizer sobre o VINHO.
Objecto de ideias e conhecimentos, práticas artísticas e desempenhos técnicos, o vinho pode — ele próprio — transformar-se em sujeito do olhar que construímos sobre essa mesma Vida (já não é ele quem fala; é o vinho…).
Criatura e criador, ferramenta de ócio e de negócio, mágico e prosaico, sagrado e profano, sério e jocoso, o vinho é protagonista de um diálogo entre um filósofo e uma vitivinicultora que, por virtuosa, espiritual e espirituosa (dramática…?) acção de eno-alquimia, acabam por se converter/seduzir um no/ao outro.
Afonso, pensador de metafísicas e dialécticas, afinal falando como inesperado vinhateiro.
Tem cerca de 50 anos, é Professor de Filosofia numa Universidade, mas oriundo do ambiente rural onde, ainda pouco mais que miúdo, “arrastara a asa” à mãe da sua agora interlocutora.
Culto e rigoroso, mas sem presunçosa ou falsa erudição, é indisfarçável (sobretudo na primeira metade da peça) um ligeiro “tique” doutoral que, no entanto, se manifesta com paciente bonomia — mas sem paternalismo e com alguma respiração poética — na conversa que mantém com a jovem Sara.
Como essa bonomia pode evoluir (paulatinamente e sem obviedade), sugerindo qualquer estratégia de sedução, é coisa que se verá….
Sara, empresária do vinho (e da vinha…), que se transforma, também afinal, em improvável filósofa.
Com pouco menos de 30 anos, dirige já a empresa familiar herdada da mãe, morta acidentalmente há menos de uma década. Tinha sido esta que transformara as vinhas dos avós em rentável exploração vinícola.
O seu precoce envolvimento na vida “real”, bem como a responsabilidade social que sobre ela tinha caído, gerara uma personalidade pragmática, ansiosa de eficácia nos resultados, com um discurso prático e veemente, nada dado a especulações filosóficas.
O desenrolar da acção (e não apenas o vinho que nela se consume) revelará, porém, outras características, conferindo diferentes e inesperadas cores ao que diz e faz.
o Músico, um crítico de teatro, é ele que, no início, prazenteiramente apresenta a peça e introduz o tema, incisivamente pontua e esclarece o seu decurso e, no fim, poeticamente comenta e abrange a sua intenção dramatúrgica.
negro vino que alegras el corazón del hombre
Jorge Luís Borges
Ficha Artística e técnica
Texto de João Luís Oliva
Encenação de Paulo Duarte
Direção Musical de Rui Souza
Espaço Cénico/ Adereços e Figurinos de Helen Ainsworth
Apoio À Cenografia/ Adereços e figurinos por Carlos Cal e Maria da Conceição Almeida
Interpretação de Eduardo Correia, Rui Souza e Sandra Barreto
Produção e Comunicação de Paula Teixeira
Assistência à Produção e Comunicação por Susana Duarte
Direção de Cena de Abel Duarte
Cartaz de Helen Ainsworth
O Teatro do Montemuro iniciou a sua actividade em 1990, trabalhando de uma forma experimental até 1995. A ausência de actividades culturais, a falta de oportunidades e o inconformismo foram algumas das razões que levaram um grupo de jovens a investir a sua energia num projeto que lhes permitiria fixarem-se na sua terra. Hoje a pequena aldeia de Campo Benfeito “encravada” entre os montes, tornou-se um local de referência na criação, difusão e programação artística. A existência do Teatro do Montemuro situado num lugar inóspito entre caminhos que serpenteiam a serra do Montemuro veio dinamizar a região, descentralizar as artes e proporcionar a estas gentes uma oferta cultural de qualidade. O Teatro do Montemuro assume-se por obrigação e vocação uma companhia itinerante, que investe os seus recursos humanos e técnicos na circulação das suas produções artísticas. A companhia continua apostar na criação de textos originais contemporâneos, inspirando-se nas mais variadas situações da actualidade. Tudo acontece num processo colectivo que une autores, encenadores, cenógrafos, actores e músicos. O texto tem uma função fundamental, somos em primeiro lugar contadores de histórias. A linha narrativa é a espinha dorsal do nosso trabalho, mas a palavra não é a única linguagem dos nossos projetos artísticos, continuamos a apostar em cenários, musica, figurinos, luz, som e nas diferentes técnicas teatrais. Tudo faz parte de uma linguagem aparentemente complexa e absurda, mas que no final permite que o objecto artístico fale para diferentes públicos com a mesma voz. Uma das referências que distingue o Teatro do Montemuro é a originalidade e autenticidade dos seus espectáculos. O trabalho dos seus actores assenta particularmente na sinceridade na emoção e na fisicalidade. A identidade artística foi sendo criada com base nas vivências rurais, mas principalmente através da partilha humana que desde o inicio a companhia promove.